Notas
Soja: Compradores com margens apertadas e vendedores retraídos travam negócios no BR
«A palavra que define o mercado físico da soja no mundo é letargia», explica o consultor em agronegócio da Terra Agronegócios, Ênio Fernandes. Com 50% da safra 2018/19 já comercializada, os novos negócios estão extremamente escassos no país e os bons números das exportações brasileiras refletem operações fechadas antecipadamente, com preços que em determinado momento eram mais atrativos para os produtores.
Nos portos, as referências continuam no intervalo de R$ 76,00 a R$ 78,00 por saca e, ainda como explica o consultor, para o produtor que garantiu boas produtividades, as margens neste momento ainda são saudáveis. No entanto, insuficientes para fazê-lo participar do mercado novamente. «Com margens mais apertadas, teremos que ser mais eficientes em gestão», completa o especialista.
Os atuais prêmios ajudam a ilustrar o atual cenário. Há algumas semanas atuando na casa de 40 a 50 cents de dólar sobre os preços de Chicago, os valores para as principais posições de entrega nos terminais do país recuaram para próximo de 23 cents e também desestimulam os novos negócios. Para março do ano que vem, os prêmios se mostram em apenas 8 cents acima da CBOT, como relata Fernandes.
A demanda é presente, no entanto, menos pujante. De acordo com os últimos números da Secex (Secretaria de Comércio Exterior), o Brasil exportou 5,04 milhões de toneladas nas duas primeiras semanas de abril, com uma média diária de 504,4 mil toneladas. Embora menor do que a média da semana anterior – de 604,6 mil toneladas – o volume diário de embarques supera as 488,5 mil de abril de 2018.
As perspectivas iniciais indicavam que o mês poderia bater um novo recorde, inclusive do mesmo período do ano passado – quando o Brasil exportou 10,5 milhões de toneladas. No entanto, esse ritmo mais lento dos novos negócios poderia mudar ligeiramente essa projeção.
Ainda assim, em todo o acumulado de 2019 as vendas externas brasileiras de soja somam 22,2 milhões de toneladas, contra 17 milhões do mesmo período de 2018.
Embora os volumes sejam maiores neste ano, as comparações do mercado nacional são quase que injustas com o anterior, quando a guerra comercial entre China e EUA registrava um dos seus picos e os prêmios pagos pela oleaginosa do Brasil superavam os 100 centavos de dólar. Em 16 de abril de 2018, a posição de entrega maio tinha 130 cents e a de julho, 140. Nos melhores momentos, os prêmios brasileiros chegaram a marcar até 300 pontos acima de Chicago.
Há um ano, as preocupações eram maiores, as especulações mais intensas e a demanda, mais forte. O surto de peste suína africana chegou ao mercado – e ao consumo chinês e de demais países asiáticos – no meio da disputa comercial, alimentando ainda mais a letargia dos preços também no mercado internacional.
«Há uma série de incertezas, se tem acordo, se não tem acordo, o clima ruim nos EUA…e a soja continua lá, estática nos US$ 9,00 por bushel em Chicago», diz Ênio Fernandes.
Ruim para o produtor, mais difícil ainda para as tradings, ainda como explica o consultor. Segundo ele, as tradings estariam cobertas somente até meados de maio e sua situação se agrava a partir de junho. Quanto mais as negociações são adiadas, mais os embarques começam a coincidir – principalmente entre soja e milho – atrapalhando seus planejamentos, já comprometidos com a falta de venda dos produtores.
Além disso, ainda segundo explica Fernandes, as margens dessas empresas estão drasticamente apertadas. «Um produto que custa US$ 350,00 por toneladas hoje dá uma margem de US$ 3,00/t», diz. «O ano passado foi o melhor da história, esse ano há um risco enorme na mesa. O mercado precisa rodar, as tradings precisariam etimular os negócios com prêmios melhores, mas não conseguem passar esse prêmio para frente. E isso pode ficar ainda mais difícil se o dólar cair, o que pode retrair ainda mais o produtor», completa.
Para o consultor, o produtor poderia «ter tolerância por pelo menos mais 20 dias», que é quando o mercado climático nos EUA pode pegar um pouco mais de espaço entre os traders em Chicago. Além disso, a safra do Brasil é menor, e o saldo exportável de soja, portanto, também é mais limitado.
O que se espera, portanto, é uma escassez de oferta no mercado brasileiro depois do primeiro semestre. Segundo Vlamir Brandalizze, consultor da Brandalizze Consulting, as exportações deverão puxar altos volumes ainda da oferta brasileira, deixando o mercado interno mais enxuto e, consequentemente, mais disputado.
«Isso vai obrigar as indústrias a correr atrás do grão. Estamos em um ano em que deveremos ter também um crescimento da demanda também por farelo e óleo internamente, então não temos condições de continuar exportando nesse ritmo porque vai faltar soja», diz o especialista.
Assim, o efeito dessa possibilidade de uma escassez de produto no Brasil só chegará aos preços, segundo Brandalizze, quando o produtor sentir essa valorização da oleaginosa, principalmente, internamente.
«E por enquanto, a indústria não está muito agressiva, está comprando da mão pra boca. Ela não está forçando porque é uma fase final de colheita, então não quer forçar essa pressão de compra, esperando fechar para se posicionar e saber como se planejar para atender a demanda até o ano que vem», diz.
Este é o momento mais frágil do ano, ainda como explica Brandalizze, que é o momento de mais dívida dos produtores – abril e maio – e depois o mercado entra na questão climática dos EUA – que pode ser favorável para os preços – e a entressafra brasileira que vai acontecer mais cedo este ano em função das exportações muito rápidas. «Os fatores estão alinhados para haver um momento melhor 30 a 40 dias para frente», conclui.
China
O Brasil se mantém como maior exportador mundial de soja e hoje é o principal fornecedor da oleaginosa para a China, que é o maior comprador do globo. Em todo mês de março, as vendas externas do Brasil foram de 90,09 milhões de toneladas e, como mostra o Imea (Instituto Mato-Grossense de Economia Agropecuária), deste total, 27,43% foi de soja do estado.
«No acumulado até março, Mato Grosso exportou 5,20 milhões de toneladas, 7,71% a mais
que o mesmo período em 2018. A China foi o principal destino da oleaginosa produzida pelo estado, sendo o país asiático responsável por 50,33% do total exportado por Mato Grosso, seguido pela Espanha, com 10,95% de participação», mostra o reporte semanal do instituto.
E enquanto um acordo não se firma entre chineses e americanos, o consumo da nação asiática, mesmo menos intenso, segue focado no produto brasileiro. «O prazo para a China ter uma decisão rápida já passou e agora é provável que ela demore mais, que não saia tão rápido. Os americanos estão colocando muitas coisas nas negociações e a China buscou alternativas para os produtos dela, buscando novos mercados depois de perder parte dos EUA», explica Brandalizze.
Dessa forma, garantindo alguns resultados melhores do que o esperado, a China se reserva no direito de não aceitar tudo o que vem da equipe de Donald Trump e, no caso da soja, segue focada no Brasil, portanto.
«Como os chineses estão conseguindo comprar aqui, como mostram nossos números de exportações – com a maior parte dessas vendas à China, que são maiores do que no mesmo período do ano passado – não os obriga a aceitar um acordo sem levar alguma vantagem, somente para liberar compras de soja nos EUA, ela consegue se abastecer no mercado brasileiro», explica o consultor. «E isso, para os chineses, ter o Brasil como fornecedor é uma espécie de carta na manga para eles, continua sobrando soja americana e vai embora a do Brasil», completa.
Nos Estados
Segundo Ênio Fernandes, os estados mais adiantados na comercialização são Mato Grosso e Goiás. E de acordo com o delegado da Aprosoja MT, Altemar Kroling, na região de Diamantino, os sojicultores já têm algo entre 50% e 60% de sua soja da safra 2018/19 comercializados, e o restante aguardando para voltar ao mercado em momentos mais oportunos a diante.
No Maranhão, a situação é semelhante, segundo José Carlos Oliveira de Paula presidente da Aprosoja MA. As negociações neste momento estão paradasm, com o estado já tendo vendido 60% de sua produção. O restante do volume deverá voltar a ser comercializado mais a frente, com os produtores na espera de referências melhores.
No Mato Grosso do Sul, Frederico Azevedo, diretor executivo da Aprosoja MS, explica que aproximadamente 58% da soja 2018/19 já comercializada, índice que fica dentro da média histórica.
Ao mesmo tempo, com cerca de 35% da comercialização realizada, o Rio Grande do Sul é o mais atrasado nos negócios desta temporada.
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Por: Carla MendesFonte: Notícias Agrícolas
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